quinta-feira, setembro 28, 2006

Algumas razões para gostar da Sara Tavares

Descobri no outro dia que gosto da Sara Tavares! Mais do que isso, descobri que há uma série de razões objectivas e indisputáveis, que justificam plenamente que qualquer bom português, moderno, letrado, de óculos de massa e frequentador assíduo do King Triplex - alguém como eu - ame a Sara Tavares como se de uma filha se tratasse. Ou ainda melhor: ame a Sara Tavares, como se dos seus óculos de massa, se tratasse!

E passo a enunciá-las.

Em primeiro lugar, a Sara Tavares é preta! É verdade e não vale a pena negá-lo, porque salta à vista! Não é preta como um barrote queimado, como dizia o poeta, nem seria mais invisível numa mina de carvão, à noite, de boca fechada e vestida de ninja, do que qualquer outro ser humano. Mas é, concerteza, preta o suficiente para que não haja nenhuma dúvida sobre a sua origem: África, África, África! Ninguém tem aquele tom de pele, se não tiver uma origem Africana, como está bem explícito na bíblia!

Ou seja, em termos práticos, gostar da Sara Tavares e, principalmente, apregoá-lo aos 4 ventos com orgulho e jactância, é uma manifestação de tolerância, modernidade e atitude globalizada! É dizer não ao racismo! É aceitar a diferença, sem preconceitos parvos e retrógrados! Todos diferentes, todos iguais! Ebony and ivory! Branco é, galinha o põe!

É equivalente a ter um amigo preto e ser visto com ele num local público em amena cavaqueira, sem medo das consequências! É pertencer ao Povo de Seattle sem ter de levar na tromba da polícia de choque, nem ir a Seattle! É andar nos transportes públicos com um livro do Chomsky debaixo do braço e um lenço da OLP a servir de cachecol!

E para quem, como eu, se move em círculos mais selectos e, por isso, tem dificuldades em descobrir pretos adequados, com quem seja possível estabelecer a tão desejada amizade sem colocar em risco a própria vida, amar a Sara Tavares como a Cristo e cantar esse amor como Camões, para que todo o mundo saiba, é a solução ideal! Porque é prático, é fácil e resolve o problema!

Eu sou racista? Ó meu amigo, não vês que estou a ouvir Sara Tavares, o diamante negro africano, com o som no máximo? Como é que me podes chamar racista, nestas condições?

É como se, de repente, passásse a ter uma caixa multibanco de tolerância e progressismo à porta de casa, onde se pode fazer levantamentos de politicamente correcto, de uma forma simples e eficaz... e sem descontar no saldo!

Em segundo lugar - e este ponto está intimamente ligado ao primeiro - a Sara Tavares é um símbolo da integração dos emigrantes na sociedade portuguesa. É um hino ao multiculturalismo e um feijão no melting pot fervilhante de Lisboa! É filha de emigrantes, mas passou praticamente toda a vida em Portugal... mas não renega as suas origens africanas! Canta em bom português e gosta de salpicar os seus temas de misteriosos e apimentados vocábulos, cujo som nos transporta para as planícies de terra avermelhada e para a imensa e belíssima savana, onde os felinos trucidam as gazelas, no meio de um banho de sangue horripilante, e os hipopótamos soltam flatulência despudoradamente. Ouvir a sua música com o volume no máximo, no conforto do lar, é como berrar na cara dos vizinhos intolerantes "Também eu amo áfrica, apesar de nunca lá ter estado! Também eu amo os emigrantes! Também eu amo os hipopótamos e a sua flatulência tão sonora! Também eu amo o multiculturalismo e a estrangeirada e não me importo nada que venham roubar os nossos empregos e as nossas carteiras!". Sai muito mais barato do que ter uma empregada emigrante ilegal em casa, para exibir nos serões culturais!

Por fim, há a questão da positividade. A Sara Tavares é positiva. Está sempre contente. É mais feliz que a Floribela! É mais feliz que a Felizbela! É mais feliz que a felicidade! Gosta de estar viva e não deixa que nada lhe roube a alegria. As suas canções são luminosas, ritmadas e forçam o sorriso no focinho da mais cabisbaixa das criaturas de Deus! É melhor que cirurgia plástica! Gostar da Sara Tavares é, por isso, também uma tomada de posição económico-social! É assumir perante o país que temos confiança na recuperação económica, no combate ao deficit e no choque tecnológico. É o mesmo que furar a segurança e dizer ao primeiro ministro: "Engenheiro Sócrates, o senhor baixou-me as calças e anda a barrar-me lubrificante no rabo desde que começou o seu mandato. Mas, apesar de agora ter ido para trás de mim e já estar de calças em baixo e vergonhas na mão, acredito piamente que não me vai sodomizar à bruta, como um bruto! Mais, acredito que vai resolver os meus problemas e os do país, trazer-nos desenvolvimento e prosperidade e garantir-nos a todos uma vida melhor! E se não for essa a sua intenção, os seus motivos forem menos nobres e a sodomia seja mesmo o seu negócio, também não há problema, que eu não perco a alegria por causa disso! É que eu gosto da Sara Tavares e aprendi a conservar a minha alegria em todas as situações!".

É caso para dizer, aproveitando a recente campanha publicitária, que a Sara Tavares me dá um... bom feeeeeeeliiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiing! Bom feeeeeeeeeliiiiiiiiiiiiiiiiiiiing!

quarta-feira, setembro 06, 2006

Carpindo as férias...

As férias morreram! Partiram ontem de madrugada, tranquilamente e sem sofrimento... e se calhar foi melhor assim.

Mas é de lágrimas nos olhos que as recordo. Descansadas, gentis, interessantes... sempre com uma sombrinha amiga onde dormir uma sesta retemperadora a seguir a uma refeição farta, sempre com águas transparentes e cálidas onde dar um mergulho refrescante numa tarde de calor abrasador, sempre com um monumentozito antigo para visitar ou um livrito para ler, quando o tédio intelectual se instalava. Em suma, sempre com ócio distribuído em doses generosas, como deve ser.

Foram férias boas! Honestas! Amigas! Partiram o molde quando as fizeram e vou sentir a sua falta diariamente, desesperadamente!

Mas a vida continua e não vale a pena derramar lágrimas sobre o túmulo das férias passadas. Ainda para mais quando se sabe, como eu sei, que, puras e generosas como eram estas, foram para um sítio melhor de certeza! Que sejam felizes no grande calendário celeste, onde todos os dias são bons para dormir até tarde e durante a tarde.

Resta-me agora respirar fundo, engolir as lágrimas e tentar viver um dia de cada vez, com calma. Dizem que o tempo cura todas as feridas. Talvez um dia consiga esquecer esta mágoa, esta dor que me perfura a alma e me aperta o peito e, quem sabe, até tirar outras férias, umas que me permitam de novo não ir trabalhar durante uns tempos e me devolvam o sorriso e a alegria.

Mas nunca vos esquecerei, férias de Agosto de 2006! Mesmo que tire outras no futuro, posso assegurar-vos que terão sempre um lugar especial no meu coração! Até sempre!