terça-feira, dezembro 20, 2005

Para quem ainda não tinha reparado: é Natal!

Nas minhas caminhadas pelas ruas de Lisboa, reparei que havia algo de diferente no ar...uma sensação indefinível de paz, alegria e fraternidade impregnava de forma muito subtil o ar.

Ao passar pela rua Augusta, observei horrorizado um árabe e um judeu ortodoxo, trajados a rigor, sentados numa esplanada em alegre convivio, frente a frente com um par de imperiais e um pires de caracóis fumegante, rindo, brincando e lançando piropos às raparigas que passavam.

Mais à frente, um grupo de super dragões e de no name boys, trajados a rigor, jogavam à sirumba. Sentados no chão, os seus amigos da juve leo, aguardavam a sua vez, discutindo acaloradamente o verdadeiro impacto do "Em busca do tempo perdido", de Proust, na literatura do século XX.

Com a minha extraordinária sensibilidade, percebi imediatamente, ao chegar ao terreiro do paço, que estes sinais, completamente ignorados pela generalidade da população, tinham um significado claro: o Natal está a chegar! Admito que a visão da árvore de natal de 72 metros de altura, 32 toneladas de peso e mais watts de luz que um concerto dos Rolling Stones, também ajudou um pouco.

Mas que época é esta, que apazigua inimigos figadais, reconcilia adeptos de clubes rivais e alfabetiza anormais, com um QI inferior ao do de uma bola de futebol da Adidas?

Para quem não sabe, o Natal é a celebração do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, o filho de Deus que, como é do dominio público, o pai mandou cá para nos salvar e - no que será forma mais original de demonstrar gratidão dos últimos 2000 anos - acabou pregado a uma cruz espetada no cimo de um monte na Palestina por alguns dos tipos que salvou! Os tempos eram outros, as gentes mais rudes e as formas de agradecimento menos sofisticadas, mas há que respeitar...para além do mais, o pai parece que ficou satisfeito, quer com o moço, quer com o pessoal que o pregou!

E o que fez este rapaz, para merecer que celebremos a data do seu nascimento?

Bom, na altura estava na moda o sermão e a pregação e, enquanto por cá andou, o altruísta Jesus não se cansou de fazer sermões e pregar! Para além do mais, pregou a paz, o amor e a solidariedade para com os mais fracos e menos favorecidos, conquistando, pasme-se, a simpatia dos mais fracos e menos favorecidos. Como, naqueles tempos dificeis, os mais fracos e menos favorecidos eram, grosso modo, toda a gente, pode-se dizer que escolheu bem o seu mercado alvo e a sua mensagem teve grande sucesso e implantação.

Outros houve que, com muito menos astúcia, pregaram a guerra e a opressão dos mais fracos pelos mais fortes, mas, dada a dimensão reduzida desse mercado, acabaram por ser nomeados ministros, viver uma vida de luxo sem trabalhar e cair no esquecimento. Houve ainda um que pregou a relatividade do espaço e do tempo em referenciais acelerados a velocidades próximas da da luz e falou do potencial energético da fusão de núcleos de átomos leves, mas todos se riram na sua cara e acabou desterrado no MIT, uma instituição para pessoas com problemas mentais e físicos nucleares.

Mas a mensagem de Jesus Cristo, conhecida pelos especialistas na matéria pela designação técnica e um pouco críptica (como os cientistas têm a mania de fazer) de "a mensagem de Jesus Cristo" ganhou tanta popularidade que perdurou até aos dias de hoje e é a principal razão pela qual celebramos até hoje o dia do seu nascimento.

E que melhor maneira de celebrar o amor, a solidariedade e o despojamento dos bens materiais, do que uma boa e tradicional histeria consumista, à moda da Galileia? Que melhor forma de homenagear o homem que correu os vendilhões do templo à chapada e ao pontapé, do que passar os fins de semana em centros comerciais atafulhados de gente até acima (os templos de hoje), correndo com os vendilhões à chapada e ao pontapé? Ou então comprando tudo o que é possível comprar, que vai dar quase ao mesmo, porque, como é sabido, se há coisa que os vendilhões nunca gostaram de fazer desde os tempos do templo, foi vender! São muito apegados aos seus produtos e parte-se-lhes o coração vê-los partir.

Assim sendo e, no verdadeiro espírito da quadra, vou ali para o Colombo homenagear Jesus e seguir a sua mensagem. Já estive a lubrificar os cartões multibanco, já calcei as botas da tropa e levo o meu taco de baseball na mão...os vendilhões que se cuidem!

segunda-feira, dezembro 05, 2005

1º Debate presidencial: o resumo

Como seria de esperar, Cavaco, cada vez mais convencido de que é uma mistura de D. Sebastião com Jesus Cristo, enviado para conduzir Portugal ao seu destino glorioso, e Alegre, cada vez mais contente com a sua barba muito republicana e com o facto de ter melhores sondagens que o Soares.

Excertos reais, retirados do debate de hoje, na SIC:

Como descreve a sua actuação como presidente da república?

Cavaco: Eu, como presidente da república, vou acabar com o deficit e com o insucesso escolar, vou transformar Portugal numa potência industrial pujante e num monstro tecnológico à escala mundial, vou ensinar economia ao Sócrates, boas maneiras ao Freitas, revelar o segredo da pedra filosofal, interpretar o papel de um grande estadista num filme independente francês multipremiado e responder a todas as perguntas filosóficas jamais feitas sobre a origem do homem, do universo e o sentido da vida. E além disso vou aprender a dizer "pograma" como deve ser e a comer bolo rei de matraca fechada.
Alegre: Antes de mais é preciso perceber o que é um presidente da república. Aliás, antes disso é preciso conhecer o que diz a Constituição da república. Aliás, coloca-se uma pergunta interessante: será que é possível perceber em termos absolutos? Será que, no próprio acto do conhecimento, não se está a contaminar de forma irreversível a própria amostra que se pretende conhecer? Será que a árvore faz barulho ao cair na floresta, se não estiver lá ninguém para ouvir? Eu, quando era deputado, votei contra as árvores caírem na floresta! A mim ninguém me cala!

Qual o posicionamento que Portugal deve ter em relação à Europa?

Cavaco: Eu é que sou o grande responsável pela Europa! Eu é que negociei todos os tratados - não só os que foram subscritos por Portugal - que levaram à criação da Europa e inventei o conceito de moeda única! Aliás, eu é que inventei o conceito de moeda! Mais: eu até já estive na Europa várias vezes! Agora é que me estou a lembrar: eu é que provoquei os movimentos tectónicos que levaram à formação do continente europeu, quando era primeiro-ministro...estava no "pograma" do meu governo! Chamam-me o "Professor Europa"!
Alegre: Bom, na Europa falam-se várias línguas e há várias culturas e é preciso perceber qual o papel da língua e da cultura portuguesas nesta europa das nações! Eu, como presidente da república, vou estudar afincadamente a europa e, quando chegar a alguma conclusão, comunicá-la-ei ao país, em horário nobre!

Qual de vocês é que é mais suprapartidário, numa frase?

Cavaco:
Eu sou tão suprapartidário quem, desde que meti o cartão de militante na gaveta, não posso ouvir falar em PSD que fico logo mal dos intestinos, cheio de flatulência. Aliás, quando o Marques Mendes me telefona para discutir a estratégia, ou aparece lá em casa para entregar os cheques de financiamento dos cartazes, a minha Maria tem de colocara máscara de gás, tal a lassidão das molas. Não há mais suprapartidário que isto!
Alegre: Eu sou tão suprapartidário que nem liguei, quando o Sócrates escolheu aquele traidor nojento, aquela víbora venenosa, aquele Judas Iscariote, aquele verme rastejante, aquela faca de dois legumes...aquele ex-amigo do Soares, para candidato do PS! Aceitei sem pestanejar, como só um verdadeiro suprapartidário poderia ter feito!